sexta-feira, 19 de abril de 2024

Capítulo 5 - Festival das Flores

Quando Ana Maria recobrou a consciência, ela estava deitada no grande sofá na sala de Dimas. Abriu os olhos devagar e encontrou a preocupação no rosto dele, que a abordou assim que percebeu:
- Você está bem?
- Acho que sim! O que aconteceu? Eu desmaiei de novo?
- De novo? Como assim?
- É complicado! - desviou o olhar
- Tem a ver com essa foto? - ele mostrou - Caiu da sua bolsa!
- Sim! - sentou-se - Acho que você não entendeu a foto.
- Se tivesse não estaria perguntando.
- Pode pegar a minha bolsa, por favor?
Ele apenas assentiu e logo entregou a bolsa para ela. Imediatamente, ela procurou o resultado do exame de sangue e o teste de farmácia e mostrou a ele. Primeiro Dimas pegou o teste de farmácia, não entendeu direito, depois pegou o exame de sangue e leu "Positivo". Não demorou muito para que ele ligasse os pontos.
- Você está grávida, Ana Maria? - indagou ainda confuso com os papéis
- Sim! - começou a chorar, como tinha feito boa parte do final de semana
- Quando descobriu?
- Foi na última semana. - saiu num sussurro, pois seu rosto já estava molhado
- Ei, olha para mim. - ele disse e ela o fez - Vamos lá para casa e podemos conversar sobre isso com calma, tudo bem?
- Claro!
- Consegue andar? Se não te ajudo a ir pro carro comigo.
- Eu consigo!
Os dois saíram e por conta da hora, o prédio já estava sem nenhum funcionário, apenas com os vigias noturnos e que nem passavam tanto no estacionamento. O carro não estava longe, ambos entraram e rumaram para a casa de Dimas, fizeram uma pequena pausa no caminho para comprar algo para jantar.
Por sorte, a casa estava quieta e toda escura, o que indicava que a avó de Dimas não tinha chegado, permitindo que ambos ficassem mais a vontade para poderem conversar.
Dimas primeiro ofereceu uma muda de roupa limpa para Ana, para que ela pudesse tomar banho. Ele fez a mesma coisa depois. Comeram num pequeno silêncio preocupante, com Ana devorando a comida como se não tivesse ingerido mais nada o dia inteiro.
- Ah, me desculpe. - ela falou quando percebeu-o olhando para ela estranho - É que eu só almocei.
- Tudo bem! - sorriu, sem graça
Terminaram a refeição e os dois resolveram ficar na sala de estar para poder conversar.
- Se sente melhor? - ele perguntou
- Sim! - observou o teto
- Temos algo importante para conversar.
- É... - piscou rápido, sentindo os olhos quererem encher de lágrimas de novo - Confesso que estou perdida sobre o que fazer. Eu joguei esse trem em cima docê e nem sei se quer...
- Por que diz isso? Achou que eu iria abandonar você assim?
- Quem sabe... Na minha cidade tem várias histórias assim! - ela mantinha as mãos juntas, acuada
- E o que você quer, Ana Maria? - soltou - Quer ter este bebê?
- Que diacho de pergunta é essa?
- Se você não quisesse, eu te levaria em algum lugar... Algum outro país em que é permitido.
- Eu nunca faria isso! - pôs a mão na barriga ainda lisa, começando a chorar novamente
- Foi só uma pergunta. - respondeu secando as lágrimas dela - Então, vamos passar por isso juntos, tá bom?
Ana Maria apenas assentiu. Dimas imediatamente abraçou-a, consolando-a e continuou:
- Vou te dar todo o apoio necessário e para o bebê depois. Mas, vamos resolvendo aos poucos.
Ela continuou chorando até que se acalmasse e pudesse argumentar sobre a situação com mais clareza.
- Só que como fica a minha situação na empresa, Dimas? E com a sua família e a minha?
- Só a Larissa que sabe né?
- Sim, só ela.
- Vamos manter em segredo por enquanto.
- O RH deve me chamar em breve, pelo plano de saúde eles sabem que eu fiz um exame.
- Eu já falei que acho essa atitude do RH horrorosa... Mas eles não me ouvem! Bom, não vai dar para esconder tanto tempo mesmo, mas vamos tentar manter o que aconteceu entre nós na festa da empresa escondido. Ninguém sabe que é você e prefiro que continue assim.
- A minha mãe vai me matar quando ela descobrir... - falou Ana - Tudo porque não sou casada!
- A minha vó vai surtar... - Dimas comentou - Tudo porque quer muito que lhe dê um bisneto!
Os dois suspiraram e se espalharam no sofá, por alguns segundos as narinas de Dimas fungaram, sentindo o cheiro de Ana novamente. E sem falar mais nada, se aproximou dela e lhe deu um beijo, como havia um mês que ele estava imaginando fazer e ela correspondeu.
Logo tudo aquilo foi ficando mais intenso, com carícias e as mãos descendo por ambos os corpos, em busca de algo mais, reacendendo a chama que ficou aquele tempo todo apenas mantida como brasa para que pudesse inflamar de novo.
Evoluindo para os dois em amassos no sofá, sem conseguir desgrudar um do outro.
- Vamos lá para cima! - disse Dimas ofegante
Assim, ele pegou Ana Maria no colo e a levou escada acima para o seu quarto, fechando a porta com um pontapé e voltando ao que estava fazendo com ela.
As peças de roupas foram saindo e se espalhando no chão próximo a cama, deixando-os mais próximos de consumar o ato. O que não demorou a acontecer!
Não se sabia qual parte era de quem, eles eram um só, nas respirações e nos movimentos. E alguns minutos depois, alcançaram o ápice, cobertos de suor e com os pulmões pedindo mais ar do que o normal.
***
Um barulho de despertador acordou os dois, mas nem tinha clareado ainda. Eles sequer perceberam que estavam dormindo abraçados.
- Que som é esse? - reclamou Dimas acendendo o abajur
- É o meu despertador... Eu esqueci de desligar esse trem. - Ana Maria respondeu sonolenta
Ele olhou o relógio no próprio celular e viu que ainda eram 5h da manhã, ainda dava para dormir um pouco mais. Ele tinha noção que muitos acordavam cedo para trabalhar, mas ainda se chocava quando percebia essa realidade bem na sua frente.
- Acho que eu preciso ir! - disse ela querendo se levantar
- Por quê? Está cedo ainda... Eu vou para lá hj, eu te levo.
- Podem nos ver!
- Não pelo estacionamento... Por favor! - suplicou, só porque queria ficar mais tempo com ela
Ana Maria se aninhou com ele embaixo das cobertas como resposta. Assim, eles conseguiram dormir mais um pouco, só para acordarem num susto por conta de outro barulho. Um grito de Dona Gertrudes que chegou e pegou os dois dormindo na cama.
- Ora, ora! O que temos aqui, Dimas?! - gritou assim que a luz atingiu o ambiente
- Vovó! - respondeu num susto - Chegou agora? - perguntou se fazendo de sonso
- Não fuja da pergunta! Quem é essa?
Ana Maria já estava escondida embaixo das cobertas, igual quando foi da primeira vez. Por sorte, era só uma senhora escandalosa e não alguém com uma câmera, mas ela ainda estava sem roupa e não sabia o que fazer.
Dimas ficou sem reação! Nem em sonho ele jogaria o segredo à tona desta forma, porém não sabia como apresentar de forma adequada.
- É uma amiga! Nós jantamos juntos e ficou tarde para ela voltar para casa. - falou tentando contê-la pois sabia que a coisa podia piorar
- Então, ela dormiu agarradinha e sem roupa com você? Vou fingir que acredito!
Nesse instante, passando direto pelo neto, a avó deu passos mais perto da cama e tirou o lençol onde Ana estava se escondendo, revelando-a. Ana olhou a senhora sem graça, porque ela nunca tinha passado por uma situação dessa.
- Ah... Bom... Dia! - saiu gaguejando a única coisa que veio a cabeça
- Sua menina sem vergonha! - esbravejou - Vá embora da minha casa agora!
Com medo e mais vergonha ainda, Ana Maria colocou depressa suas roupas, pegou sua bolsa enquanto Dimas e Gertrudes discutiam, ou melhor, ela dava um sermão nele.
O único gesto educado que a senhora permitiu foi que o neto pudesse levá-la até o portão e assim, ele o fez. O que dava tempo pelo menos para uma despedida.
- Desculpe-me por isso. Eu… - tocou de leve em Ana
- Tudo bem! Minha mãe é bem parecida! - sorriu - Bom, para onde é o metrô daqui?
- É só descer a rua até a praça, é fácil encontrar.
- O problema é que não comi nada e vão notar que estou com a mesma blusa de ontem...
- Aqui! - Dimas deu a ela algum dinheiro - Tem uma padaria na praça, para você comer algo e bem, compra uma outra blusa para você.
- Não precisa!
- Precisa sim! - insistiu - Tem que comer, por causa do bebê. - falou mais baixo
Ela suspirou e aceitou o dinheiro. Antes que ela fosse embora, os dois trocaram um beijo leve antes.
- Posso falar com você mais tarde? Me espere no estacionamento quando sair!
Ana Maria assentiu e seguiu o seu caminho, descendo a rua e alguns metros depois, se virou e acenou para Dimas, que correspondeu e espero que ela sumisse de vista para entrar novamente em casa e encarar a fúria da fera da sua avó.
***
Larissa chegou no trabalho e desesperada para encontrar com a amiga, que só tinha dado notícia na última noite, dizendo que estava com Dimas. Por sorte, quando no espaço das baias do setor delas, ela viu Ana Maria sentada na sua cadeira. Ela tinha chegado cedo assim como a amiga.
- Aninha! - falou se aproximando da amiga
- Bom dia, Lari!
- E ai? Como foi? - sentou-se na baia
- Tirando que fui expulsa a pontapés hoje de manhã... Foi tudo bem!
- Como é? - puxou a cadeira para mais perto
Então, Ana contou, num volume baixo, com todos os detalhes o ocorrido da noite anterior. Dando ênfase ao seu desmaio na cobertura do prédio e sobre a chegada da avó de Dimas, que a xingou e a fez sair dali imediatamente.
- Eu daria tudo para ter visto aquela senhora gritando e te chamando de "sem vergonha".
- Ué? Você conhece ela?
- Ela veio na empresa já algumas vezes, participava de algumas coisas nos primeiros anos do Dimas como CEO. Apesar de carrancuda, ela é simpática.
- Nisso eu discordo!
- Espero só até ela descobrir a verdade... Ela vai te botar num pedestal! Todo mundo sabe que ela é louca para que o neto case e lhe dê um bisneto. Ainda lembro quando o Dimas terminou com a Giovana, a que era balarina, porque ele gastou uma grana num cruzeiro de luxo para pedi-la em casamento e ela simplesmente não foi porque passou num teste que era o sonho da carreira dela.
- Você sabe bem das coisas né, Lari?
- Amiga, todo mundo sobe! Ele ia fazer o pedido na frente da empresa toda... Foi num dos aniversários. Deve ter uns dois ou três anos já!
- Não julgo! Também correria atrás do meu sonho...
- Eu também amiga! Mas eles se gostavam de verdade, dava para ver pelo quanto Dimas ficou magoado com a situação. Tanto que ele terminou com ela por telefone e ninguém o viu mais no cruzeiro até desembarcarmos. Nunca mais soubemos nada sobre a vida pessoal do Dimas deste então também... Até, você sabe...
- Por isso estão especulando também sobre! - Ana comentou
- Bom, o que importa agora não é o passado, mas que dê tudo certo com vocês. Aguardo novidades mais tarde!
Nesse momento resolveram encerrar a conversa, pois elas tinham que trabalhar e os colegas já começavam a chegar e elas não queriam que eles ouvissem.
***
Dimas ficou ainda um bom tempo ouvindo sermão da avó e teve que responder praticamente um questionário sobre como a garota foi parar lá. A avó estava cansada e muito triste de ver o neto apenas saindo com moças aleatórias. Ela ainda sentia muita falta da antiga namorada do neto: Giovana. E de vez em quando, ela insistia para que eles voltassem. E desta vez foi enquanto eles tomavam café.
- Ah, meu neto. Por que você realmente não tenta novamente com a Gio?
- De novo essa conversa, vovó. - Dimas bufou - Eu já lhe expliquei sobre meus motivos.
- Mas ela era uma ótima moça! Vocês eram tão felizes juntos!
- Vovó... Ela me fez passar vergonha na frente da empresa inteira!
- Mas não justificava terminar com ela daquele jeito. O que ela fez de errado?
- Não justificava? Não era nem a primeira e nem a última vez que acontecia. Estava claro que ela tinha outras prioridades, por isso decidi terminar. - mordeu a torrada com raiva
- Já tem anos isso, meu neto. Quem sabe ela já não voltou ao Brasil!
- Vovó, eu já estou em outra. Não quero saber dela, por favor!
- Em outra? Como assim? Com aquela que estava aqui hoje de manhã?
- Ela não é quem você pensa! Espere até você conhecê-la melhor.
- Não tenho como esperar nada de alguém que passa só uma noite com meu neto.
- Não foi só uma noite, vó... - ele soltou
- Como é? Ela é uma sem vergonha mesmo. - a xícara bateu mais forte do que devia na mesa - Isso porque mal passamos pelo seu escândalo na festa da empresa.
Dimas simplesmente suspirou. Tinha momentos em que ele até tentava argumentar, mas era muito difícil sua avó mudar de opinião sobre uma situação ou alguém após uma má primeira impressão. Porém, ele acreditava que isso mudaria com Ana Maria.
Ele sempre ficava chateado quando a avó tocava no assunto da ex-namorada. Era verdade que Dimas e Giovanna se amaram de verdade, mas o rapaz simplesmente cansou de ser deixado de lado por conta da carreira dela. Ele realmente queria que ela seguisse seu grande sonho, tanto que em muitas situações ele simplesmente relevou ela ter desmarcado ou não aparecido de última hora. Fosse por conta de um ensaio, de algum teste.
Ela sempre dava as mesmas desculpas e explicações e ele, bobo e apaixonado, aceitava. Entendia mais do que ninguém como era preciso tanto esforço para correr atrás do que se queria, já que naquela época passava um bom tempo viajando atrás de negócios para a Lírio D'ouro. Porém, ele e a ex-namorada raramente se encontravam, pois os dois eram bastante ocupados.
Realmente a gota que transbordou foi com a festa que seria num cruzeiro. Dimas queria que aquele momento fosse especial para os dois e queria mostrar aos seus funcionários o quanto ele estava feliz. Talvez tenha sido um pouco de falta de noção da parte dele, mas ela não ter aparecido sem sequer avisar também fora. Então, exausto e irritado com tudo aquilo, ligou para ela, que novamente deu uma desculpa e falou o quanto estava feliz de finalmente ter conseguido o papel tão sonhado. Ele respirou fundo, lhe deu os parabéns e disse que não queria mais ficar com ela, desejando toda a sorte do mundo na sua nova etapa de vida. E foi isto! Nunca mais um soube do outro!
- Dimas? Está me ouvindo? - a avó o tirou do devaneio
- Oi? - falou ele
- Quais são os planos para hoje na empresa?
- Eu tenho uma reunião agora cedo com a equipe de desenvolvimento de produtos.
- E a negociação com Charmosinha? Desistiu daquilo né?
- Não! Aliás, esse final de semana irei para o Festival das Flores.
- Para dar mais provas para aqueles que não querem você metido lá.
- Nada disso. Só quero visitar o festival, não posso?
- Em vez de se preocupar com algo mais importante!
E então Dimas pensou: Você nem faz ideia do assunto que estava tratando ontem. Mas, ele desconversou:
- Bom, vovó, já vou! Devo voltar tarde hoje, tenho umas coisas a resolver depois do horário.
- Vai sair com aquela garota de novo? - protestou - Você sempre me deixa sozinha.
- Eu cheguei e você também me deixou sozinho.
Então, o rapaz pegou sua pasta de trabalho, a chave do carro e saiu. Teria um dia atribulado, mas mais curto que o anterior pelo menos.
***
O dia de trabalho passou tranquilamente para ambos. Os colegas saíram um pouco mais cedo e Lari ficou fazendo companhia a Ana até que ela finalmente fosse descer para encontrar com Dimas. Tudo isso para diminuir ao máximo com as suspeitas!
Ele pegou o elevador e apertou o andar da garagem, esperou alguns segundos e quando a porta se abriu ele viu Ana Maria o esperando. Observou a escolha de blusa que fizera e como seu rosto se iluminou quando se encontraram. Cumprimentou-a com um beijo, perguntando:
- Como foi seu dia? Ficou enjoada? Comeu bem?
- Foi bem! - sorriu - Hoje o enjoo foi mais leve pelo menos. Acho que estou me acostumando.
- Cadê sua amiga? Larissa, né? - apontou a direção do carro
- Ela já foi! Por quê?
- Podia dar uma carona para ela também. Vou te levar em casa. - abriu a porta para Ana
- Ela pensou que poderíamos conversar algo importante e precisávamos estar a sós. Mas, vou mandar uma mensagem para ela. Não deve estar tão longe.
- Mande ela esperar na estação. Pegamos ela lá!
Ana Maria mandou mensagem para a amiga, que ficou super feliz de não ter que pegar transporte cheio. Ter sua amiga como peguete do chefe já estava mostrando suas vantagens.
Logo eles se encontraram e rumaram para a região suburbana da cidade. Conversando no caminho:
- Imagino que a Ana já te contou tudo né? - Dimas perguntou
- Claro! - riu - Que bom que você reagiu bem a notícia.
- Obrigado pela ajuda! Soube que a levou ao médico e tudo o mais.
- Ela é minha amiga, é o mínimo que deveria fazer. Sem contar que a Ana também não é daqui...
- E as suas férias? - perguntou ele para Ana - Quando são?
- Começam amanhã. Mas, eu ainda vou para a empresa e pegarei o ônibus para Charmosinha no dia seguinte.
- Também irei ao Festival das Flores. Será que podemos nos encontrar lá?
- Claro!
- Gente, por favor, troquem logo esses números de telefone. Vocês precisam se comunicar melhor! - Lari se meteu
- Toma! - deu o celular para ela - Salva seu contato e liga pro seu número para salvar o meu.
- Já devíamos ter feito isto há muito tempo. - sorriu Ana, pegando o aparelho
- Desculpa me meter, mas já me metendo. Já decidiram quando vão contar?
- Vamos deixar como segredo, como a Ana deve ter falado. Mas, sei que com o tempo não vai ter mais como esconder.
- Não consigo parar de pensar como vai ficar a situação para mim lá na empresa. Posso tomar uma justa causa!
- Grávida não, amiga. Eles não vão poder demitir você, tem uma lei que te protege.
- Ela está certa! - Dimas pegou em sua mão - Mas, eu entendo sua preocupação. Reação dos colegas e dos outros funcionários...
- Ainda mais com essa cultura conservadora. Ana não tem namorado, nem nada e vai ter um bebê? Para eles é inadmissível.
- Imagina quando eles descobrirem que o pai do bebê é só o CEO da empresa. O que eles vão falar? - Ana uniu aos mãos, receosa
- Imagina a minha vó descobrindo que a moça que ela expulsou de casa hoje de manhã está carregando o bisneto dela?
- Vai dar tudo certo, gente. Alias, eu sou a primeira apoiadora do relacionamento de vocês e bom, este bebê já é meu afilhado.
- Lari... - Ana Maria, virou para trás, repreendendo a amiga
- E quem disse que a gente tem um relacionamento? - Dimas riu sem graça
- Ué, gente... Não sei o que é, mas vocês já tem um pequeno rolo. E não estou falando que é por causa da gravidez... Foi na festa da empresa já.
Ana Maria e Dimas se olharam, constrangidos com o fato constatado bem na cara deles. Larissa realmente estava certa e estava acontecendo alguma coisa entre eles, só que ambos não sabiam ainda o que era exatamente.
Depois do comentário de Larissa, um pequeno período de silêncio se seguiu. Dimas concentrado na direção e Ana observando uma das paredes do túnel. Foi a própria Lari quem quebrou o gelo de novo.
- Ai, gente, não fica nesse silêncio não. Eu falei alguma mentira?
- Não falei que era mentira, uai! - Ana protestou - Mas também num disse que era verdade.
- Aninha, você finge muito mal. Aliás, o Dimas também. Tá estampado na cara dos dois!
- Ou será que é por que você já sabe? - ele retrucou
- Pode ser que sim! Pode ser que não! Mas fatos são fatos.
Mais um pequeno silêncio e Ana quem mudou logo de assunto.
- Animado para ir para o Festival?
- Sim! - sorriu - Vou pela segunda vez este ano. Animada também?
- Vai ser a primeira vez que volto para Charmosinha desde que me mudei.
- Deve estar com saudades de lá.
- Um pouco!
E os três foram conversando sobre outros assuntos triviais, como o próprio festival ou as novidades da empresa, durante o resto do trajeto. Larissa em alguns momentos ficou apenas assistindo o casal recém-apaixonado conversando. Ela estava feliz pela amiga ter encontrado alguém assim, mesmo que fosse apenas o dono da empresa. Só que isto era um mero detalhe!
Lari foi deixada em casa primeiro e agradeceu a carona, pedindo desculpas pelos comentários um pouco sem noção, mas era necessário que ela falasse. Dimas e Ana rumaram para a casa dela, perto dali. Os dois entraram na vila e depois na miúda quitinete. Ana preparou uma coisa rápida para que comessem e logo serviu o jantar na pequena mesa localizada ali.
- Não é muito, mas espero que goste.
- Obrigado! - disse, se servindo
Comeram por silêncio, já que a fome estava enorme. Depois, limparam tudo e sentaram no pequeno sofá para conversar.
- Sinceramente, achei que você ia para sua casa...
- E encarar minha vó de novo? -  ele riu de canto - Não estou com disposição. Ela me encheu de perguntas de manhã e bom, fará isso de novo quando eu voltar. Só preferi adiar!
- Lari me disse que sua avó é... Bem...
- Ela é uma boa pessoa, só tem alguns valores muito bem estabelecidos e quer que todos sigam.
- E a Lari comentou da sua ex...
- Ah, a Gio. Tinha um bom tempo que não pensava nela... Minha vó também fez o favor para mim hoje!
- É por isso que você se isolou? Depois dela.
- Foi sim! - olhou para baixo - Ela deixou uma ferida bem grande e que demorou a cicatrizar.
- Também tenho minhas feridas grandes e algumas já cicatrizadas, mas são por causa da minha família.
- A minha família também me deixou uma... Meus pais! E você?
- Só o meu pai... A única pessoa que realmente gostava de mim.
- Sinto muito!
- Também sinto muito!
Então, os dois aproximaram seus rostos e se beijaram. Dimas já estava inebriado por conta do cheiro presente na casa e na dona dela. Foi um beijo mais calmo, pois a carga de sentimentos presentes era bem diferente do que das outras vezes. Será que um estava curando o outro?
Ficaram alguns minutos trocando beijos e carícias leves, até que se desvencilharam, sorrindo um para o outro.
- Sua amiga tem razão... Realmente tem alguma coisa acontecendo entre a gente.
- Eu nunca senti nada assim... Por ninguém!
- Faz muito tempo que não me sinto desse jeito.
- O que somos então? - Ana Maria, perguntou, inocente
- Prefiro não dar um nome ainda. - colocou a mão sobre a barriga dela - Mas você é a mãe do meu filho e eu tenho que cuidar de vocês dois.
Ana Maria colocou a mão por cima da dele, já sentindo as primeiras lágrimas caindo.
- Vou me cuidar para que ele venha a este mundo com segurança. Prometo!
Os dois se beijaram novamente, carregados com sentimentos ainda mais intensos do que antes. Porém, não durou muito.
- Vai ficar aqui hoje a noite? - Ana perguntou, por fim
- Eu posso? - Dimas retrucou
Ela apenas assentiu e ambos dormiram juntos naquela noite, dessa vez sem nenhum parente ou alguém com uma câmera para acordá-los no susto.
***
Assim que as férias começaram oficialmente, Ana arrumou as malas e no dia seguinte pegou o ônibus na rodoviária que a levaria até a cidade de Charmosinha.
Foram mais de sete horas de viagem, até que ela desembarcou no terminal da pequena cidade do interior.
Assim que desceu do ônibus pegou o celular para pedir uma carona a algum parente, mas antes se deparou com a seguinte mensagem de Dimas:
"Espero que tenha feito uma boa viagem! Devo ir à Charmosinha nos próximos dias. Mando outra mensagem para nos encontrarmos. Cuidem-se!"
Ao terminar de ler, Ana Maria abriu um sorriso e respondeu:
"Cheguei bem! Logo chega a minha carona. A cidade já está se arrumando para o Festival."
Ela se comunicou com o Vinícius, seu cunhado, e enquanto esperava ele aparecer, já que a casa de sua família era um pouco afastada da cidade, Ana se pegou observando aquela cidade que sempre parecia a mesma, não importava quanto tempo passasse. Tinha pouco mais de um ano que ela não via aquelas ruas e não tinha mudado nada das suas lembranças de infância. A única coisa que sempre era mesmo diferente era a decoração para o Festival das Flores. Ele começaria no dia seguinte e as primeiras barracas já estavam sendo montadas, dando ainda mais a cara do evento, junto com as bandeiras coloridas e arranjos de flores amarrados nos postes. Tudo aquilo trazia sempre a vida numa cidade tão pacata!
A viagem fora longa, então o Sol já estava se despedindo e indo dar lugar para a noite. Então, muitos já estavam se arrumando para poder voltar para suas casas. Ana se sentiu um bocado nostálgica e ficou tão distraída que sequer percebeu que seu cunhado chegara.
- Não está ouvindo eu te chamar? - reclamou já parado na frente dela
- Ah, desculpa. Eu estava olhando a decoração!
- Sua mãe e suas irmãs estão ansiosas para te ver. - disse pegando a mala dela
- Você não comentou nada do que aconteceu no hotel né?
- Não, imagina se o povo da cidade descobre que você se envolveu com aquele lá.
- Por culpa de vocês! - ela entrou no carro
- Detalhe! E o safado está nos processando...
- Com razão! - bufou - E mudou de assunto: E como está a gravidez da minha irmã?
- Aquele menino dentro dela tá enorme, parece que ela vai explodir.
Os dois fizeram um percurso de uns 10 minutos de carro, o que daria uma boa caminhada, logo chegando a casa. Era uma casa grande, já que eram três filhas e duas delas ainda moravam na casa. A mãe de Ana Maria, Marisa, já estava no portão para recepcioná-la.
- Que saudade da minha filha querida! - disse abraçando-a - E como está lá no Rio?
- Tá tudo bem! Trabalhando bastante.
- Deve estar com fome, preparei uma coisa gostosa para você.
Entraram e Ana foi recebida pelas suas duas irmãs. Uma bem magra e alta, já a outra era mais baixa e estava com uma barriga bem saliente. Elas eram Carolina e Vitória, respectivamente.
Logo a família se sentou à mesa e o clima da refeição foi bem agradável, com eles dois perguntando o que ela fazia na cidade e no que trabalhava. Ana se atentou a não contar detalhes demais para não levantar nenhuma suspeita que ficasse ruim para seu lado. Ela sabia que assim como Vinícius, sua mãe não gostava da Lirio D'Ouro e nem de Dimas. E outra coisa que ela sabia que aquele clima não ia durar por muito tempo, era o costume.
Por sorte, as horas passaram rapidamente e todos se recolheram para dormir. Ana deixou as malas no seu antigo quarto e tomou um banho. Deu uma última olhada no celular para poder apagar as luzes e terminar o dia cansativo. Haviam duas mensagens novas, uma de Larissa e uma resposta de Dimas.
"E ai, Aninha, chegou bem? Confesso que queria muito ter ido com você para poder conhecer o festival. Aproveite seu descanso e cuide bem do meu afilhado, viu?"
Ana Maria sorriu com a mensagem e respondeu:
"A viagem é bem cansativa, mas cheguei bem sim, Lari. Já estou com saudades de você! haha  Precisamos marcar para você vir no festival ano que vem, sem falta."
E a de Dimas, dizia o seguinte:
"Amanhã pego o voo para BH e depois vou de carro para a cidade. Devo chegar ainda de manhã. Onde te encontro?"
"Não devo ir para o Festival tão cedo, mas podemos nos encontrar perto da minha casa. Ai você me dá uma carona até o centro da cidade." Ela digitou como resposta.
Ela passou o endereço em seguida, reforçando que ele deveria tomar muito cuidado para não ser visto, principalmente por causa do cunhado e do pai dele. Desejou boa noite a ele, apagou as luzes do quarto e foi dormir. Pego no sono com a sua mão em cima da barriga.
***
O dia seguinte chegou, incomodando os olhos de Ana Maria, que despertou e por sorte, não tinha acordado enjoada naquela manhã. Pensou finalmente estar se acostumando com as sensações do seu corpo.
Foi até a cozinha e todos já estavam acordados. Se cumprimentaram, Ana sentou-se à mesa e começou a se servir. A mãe perguntou:
- Dormiu bem, filha?
- Sim! Ainda porque estava bem cansada no ônibus.
- Vai ao Festival hoje, irmã? - perguntou uma
- Um pouco mais tarde. Quero ficar um pouco no jardim das tulipas primeiro.
- Ah, claro!
- Não vão participar do Festival novamente este ano? - Ana indagou
- É muito cansativo! Nos outros anos não valeu a pena!
- É o evento mais importante do ano, o mais movimentado... - ela retrucou
- E o que você sabe sobre, não é, irmã? - falou a outra irmã
- Ficou um ano na cidade grande e já está achando que sabe de tudo.
- E falando os trem igual o povo da cidade.
- Uai, mas eu falei alguma mentira? Papai sempre participava do Festival das Flores!
- Não cite o nome dele... - falou a mãe
- Tudo bem, me desculpa! - disse olhando para a comida que mal tocara - Eu perdi a fome! Com licença.
Saiu da sala e foi para a plantação na parte de trás do terreno da família. Ela não teve como olhar o jardim das tulipas direito quando chegara, mas logo percebeu o quanto estavam maltratadas. As mesmas tulipas que seu pai criava com muito carinho e amor, vendendo para as cidades vizinhas e também fazia questão de sempre participar do Festival das Flores. Foi desta forma que ele conseguiu sustentar toda a família e criar suas três filhas.
Era por esse motivo que ela tinha saído de Charmosinha, por conta da morte do pai e depois todo o descaso do resto da família em continuar com o negócio das flores. Ana ainda tentou por alguns meses, mas percebeu que só estava tentando tapar um vazio que nunca mais ia sumir. Por isso que a irmã tinha se casado, pois Paulo, pai de Vinícius, era um dos maiores produtores da cidade e podia sustentá-la. A mãe ficou com o dinheiro da pensão pelo falecimento do marido. A irmã mais velha trabalhava numa das lojas da cidade. Para Ana restou apenas pensar mais do que sobreviver dentro daquele pequeno mundo, mesmo que isso tivesse custado muito às flores daquele jardim.
As primeiras lágrimas começaram a cair de seus olhos. Uma angústia enchia seu coração. E mesmo assim, aquelas tulipas de várias cores traziam as lembranças de tantos momentos felizes que viveu ao lado de seu pai. Indo às feiras e todos os anos ao festival. Por isso que mesmo distante, ela fez questão de vir para o Festival das Flores, era o seu evento favorito do ano! Porém, ela também chorava por conta de tudo o que acontecera nos últimos meses e suas preocupações dali para frente. Afinal, em breve ela teria um filho de quem deveria cuidar.
- Ah, pai, queria tanto que o senhor estivesse aqui. - disse sozinha, colocando a mão no ventre - Acho que você ia ficar tão feliz com a notícia...
E comentou depois, falando com o pequeno ser dentro dela:
- E bebê, você ia gostar de conhecer o seu avô! Imagino você colhendo as tulipas com ele, igual a mamãe fazia. - sorriu, sonhando
E ela ficou ali, não sabe por quanto tempo, apenas aproveitando a brisa e sol da manhã, entre ciclos de parar e voltar a chorar. Sua barriga roncou de fome, pois ela não havia comido direito, por conta do atrito que quis evitar. Decidiu se recompor e voltar para dentro para poder comer alguma coisa. Caminhou de volta para a casa, dando de cara com a mãe e as duas irmãs, segurando três objetos: Um teste de gravidez, o resultado do exame de sangue, a foto do ultrassom.
- Ana Maria, ocê pode me dizer o que significa isso?

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